Editorial do mês
Por Claudia Maciel
Jornalista
Do que os jovens precisam?
É desumano saber que existem jovens invisibilizados pelas desigualdades, preconceitos e exclusões e não sentir inquietação, inconformidade e não entrar para a “turma da contestação” que deseja fabricar um antídoto contra as bactérias que violentam a integridade da juventude.
Ao entrar para a turma inconformada conhecemos diversos tipos de reações: A primeira e mais comum, são as pessoas que só procuram apontar os culpados das falhas nas poucas ações que são feitas em prol das comunidades, outras que possuem compromisso e vontade de realizar mais atividades nas periferias, só que por vezes, são um tanto fora da realidade destes jovens por utilizarem meios e pessoas externas as favelas, que sabem apenas teoricamente o que é a vida desses invisíveis (jovens que a sociedade finge não enxergá-los).
Por outro lado, vemos também, algumas instituições como exemplo, a Central Única das Favelas (CUFA), um movimento juvenil de negros e periféricos que faz totalmente o oposto - a CUFA fabrica o antídoto a partir da lógica do veneno, leva em conta a realidade de cada periferia trazendo os invisíveis de diversos estilos de vida para integrar esta “turma da contestação”.
E faz isso da maneira mais natural possível, mapeia toda a região considerada favela (locais sem infra-estrutura, saneamento básico, onde pessoas não conseguem gerir suas vidas sozinhas), visita estes locais, conhece a comunidade, escuta os problemas enfrentados pelos moradores, integra e prepara o individuo nas oficinas, cursos e demais trabalhos já realizados pela CUFA, e após, junto com eles, sai em busca da humanização do lugarejo. É uma iniciativa única no país, desta rede que hoje está nos 27 Estados.
A Liga Internacional de Basquete de Rua (LIIBRA) é um exemplo da organização e regularização de ações da “turma dos inquietos”, é realizada pela CUFA, ou seja, pelos ex-invisíveis que compõem o movimento. É um projeto esportivo, cultural e educativo para os jovens participarem com suas famílias com música e arte urbana, que pretende organizar e espalhar a "cultura da rua" por meio do esporte.
O palco da Liga é a própria favela com a proposta de revitalizar o espaço de quem lá reside, seja uma praça inteira como a Praça do Cidadão, em Ceilândia, região administrativa do DF, ou então apenas, um visual agradável longe das pichações como feito nas paredes da escola infantil de São Sebastião, também no DF. E vai além, traz as pessoas de outras localidades da cidade para conhecer o modo de vida das favelas e quem sabe, contribuir com a gestão das vidas daquelas pessoas.
O campeonato é o elo entre o esporte, a cultura Hip Hop e o movimento social, dando assim, o sentido definitivo ao basquete de Rua, que é a arte que dá ao jogador a liberdade de criar e improvisar jogadas, onde são valorizadas, principalmente, a habilidade e criatividade de cada atleta e a altura não é fator indispensável. E quem assiste a uma dessas disputas tem a garantia de presenciar um verdadeiro espetáculo, com jogadas inesperadas e enterradas sensacionais.
A LIIBRA é realizada nos 27 estados pelas bases da CUFA do período de abril a setembro, é um evento reconhecido e chancelado socialmente pela UNESCO e esportivamente pelo Ministério dos Esportes, que, hoje, agrega mais de 80 mil praticantes em todo território nacional, e que em 2008, conquistou novos horizontes, com o 1º Desafio Internacional de Basquete de Rua, envolvendo o Brasil e o Chile.
E consegue ser ainda, um exercício de (re) construção da auto-estima, algo fundamental para desconstruir o conceito histórico de incapaz, desqualificado para protagonistas de suas vidas, sagazes e preparados. Proposta esta, que todos precisam incentivar, pois impacta diretamente na vida, na sobrevivência e na dignidade da juventude brasileira que continua acreditando e apostando nas cores e na dignidade do seu país.
Por algum motivo, a organização política da juventude na sociedade brasileira foi liderada, por muito tempo, pela organização da juventude estudantil da classe média urbana, porém, o processo de quebra dessa invisibilidade dos jovens e negros moradores de periferia exige do Estado e do conjunto da sociedade (de todas as classes) diversos tipos de ações assim como a LIIBRA.
Todos os jovens precisam de oportunidade, planejar seu futuro desde cedo, se conhecer, de ousadia e estudo, limites, alguém que lhe dê mimos, de aprender a cuidar da saúde, de estar antenado nos novos acontecimentos.
Eles precisam de ações sociais da CUFA, do AFROREGGAE, da Rede de Juventude para o Meio Ambiente (REJUMA), do Plano Internacional (PLAN) de outras entidades, do Estado, da sociedade.